Porque me tornei feminista?



Um dia alguém me perguntou 

Como é tão fácil pra você ser gentil com outras pessoas?

e eu disse porque não foram gentis comigo!


O primeiro menino que me beijou 

segurou os meus ombros com força

foi um beijo roubado sem consentimento 

um beijo ríspido 

ele tinha cheiro de desafio e impunidade

fomos parar na diretora da escola 

a minha mãe chorou

o meu pai ficou com raiva 

e eu tinha apenas 10 anos


Ele foi o primeiro menino a me ensinar que meu corpo

foi feito para dar aos que quisessem 

que eu me sentisse qualquer coisa

menos inteira


A minha primeira vez, aos 18

foi com um homem que me pressionou ao extremo

que me fez ceder, somente por que o líquido escorria entre as minhas pernas 

e disse que eu estava pronta, 

ali sem roupas ele dizia que eu não podia voltar atrás

Doeu e eu percebi que não havia prazer ali,

só dor, dor e dor, a tríade da dor psíquica, física e moral 

A pressão foi tanta que eu cedi 

e de brinde quando o ato terminou

ele virou de lado 

e disse que não era amor, era só sexo e que não estávamos namorando


os sentimentos foram da luxúria ao lixo

a poeira dos pés, um nada

afinal nada daquilo significava 

mesmo eu tendo esperado tanto tempo para me sentir inteira

e de fato eu me sentia vazia

com(o) uma membrana rompida e violada


O meu primeiro amor aos 21

me prometia casamento

e eu achava que dessa vez seria diferente 

diferente era o endereço!

eu fui trocada pela colega do Muay Thai

 No fim, não havia justificativas, os melhores 2 anos da minha vida, não tinham um porque de terminar

descobri a traição anos depois, ele me substituíra em menos de duas semanas, 



Ele partiu e eu queria que ele ficasse 

eu sentia que merecia alguém que quisesse ficar

alguém de preferência que não cantava I'll always love you do Elvis no chuveiro 

e não partisse meu coração em pedaços 


Eu passei dias na cama chorando,

nem o colo de mãe amenizava a dor,

eu chorava tentando trazê-lo de volta

eu não via sentido na vida, e nessa completa anedonia,

eu me perdi

O sol se transformou em Lua 

A lua se transformou em sol

A faculdade não importava mais, nem as notas vermelhas do boletim

Não havia pelo que lutar 

me cortei tentando sentir uma dor física, 

não aquela que doía tanto,

queria aquela que fosse palpável, aquela que sangrava


A morte era um caminho menos pior que a dor que eu

sentia, desse coração partido que só queria amar!


Três anos se passaram 

e eu conseguir pegar no sono

cicatrizar as minhas feridas,

raiva, ódio, desprezo e revolta vieram

até que uma hora era só insensibilidade 

anestesiada

me tornei assexuada

ergui muros ao redor

proibi o meu coração amar novamente


Escreva seus medos o terapeuta me disse

e eu desenferrujei a caneta e o papel 

não tenho pena! Almejo que não tenhas pena também

Eu me tornei forte, trabalhei a carência da figura paterna 

na psicoterapia de Freud 

falei com a minha mãe sobre empoderamento feminino 

e escolhi não concertar os homens, afinal eu sou inteira e não mereço parafusos a menos


Eu me reconstrui 

Dancei sozinha para mim mesma

Dancei em cima das cinzas daqueles que duvidaram 

Sigo por ai não procurando um coadjuvante na minha história

mas sendo autora da própria linha

Redescobri o meu cabelo, o meu amor próprio

E que princesas salvam a si mesmas 

e que sobrevive a todos os primeiros 

porque na segunda-feira a vida continua !


Texto inspirado em "outros jeitos de usar a boca", de Rupi Kaur e experiências de vida



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